sábado, 25 de março de 2017

10 coisas para se fazer antes de partir - Decolagem

Comecei a pensar em coisas rápidas para fazer, mesmo com minhas habilidades físicas comprometidas e meu pouco tempo. Pensei em fazer cursos ou outra especialização, mas isso me tomaria muito tempo e uma disponibilidade que não tinha. Também me imaginei pulando de paraquedas, dançando, fazendo qualquer atividade física e logo depois tendo uma crise respiratória. Quase desisti quando pensei em procurar algo na internet. Digitei “formas de entretenimento para pessoas com câncer”, não tive muito sucesso; era até deprimente de ler. Então eu simplesmente deixei pra lá e fui para o quarto da minha mãe; me joguei na cama ao lado dela.
-Eu vou viajar semana que vem.
-Posso ir? - Perguntei já esperando uma resposta negativa; afinal, uma pessoa no meu estado não poderia sair assim…
-Pode. Estava pensando onde podemos ficar hospedadas.
-Quê?! - Disse bastante animada com a surpresa.
-Vamos! A viagem é semana que vem.
-Temos que ir no comércio comprar algumas coisas. Não tenho malas.
-Nem roupas que te protejam do frio de São Paulo.
-São Paulo?
-Sim. - Ela respirou fundo. - Que horas são?
-Meio dia.
-Acho que dá tempo de ir ao comércio.
Nos arrumamos e pegamos o carro para ir. Andamos por várias lojas de acessórios e malas de viagem, sempre olhando com atenção e comprando o que seria necessário levar. O dinheiro estava curto e minha doença não é motivo para deixar mamãe com dívidas exorbitantes. Quanto mais andávamos, mais eu ficava cansada. Duas horas depois eu já estava exausta demais para continuar andando naquele local quente.
-Mãe, estou muito cansada. Podemos ir embora?
-Claro minha filha. Amanhã voltamos, ok? Ainda preciso comprar algumas coisas.
E voltamos no dia seguinte, passando sempre pouco tempo. Eu me sentia cada vez mais cansada por causa da quimio. Meus cabelos estavam caindo, mas eu aceitei isso com uma rapidez tão grande que já não ligava que no dia da viagem eu estaria careca.
Entramos no aeroporto com nossas malas escandalosas compradas no comércio e todos nos olhavam; estávamos bastante diferentes, um dos nossos truques para identificarmos as malas de longe. Fizemos todos os rituais preparativos para o voo - nos quais eu fui parada e tive que jogar um desodorante fora; então, decolamos. Eu dormi a viagem inteira.
Chegamos naquela cidade fria, mas eu estava com moletom colorido por causa do avião. Todos olhavam para nós novamente. Eram várias pessoas iguais, com malas e roupas iguais. Estávamos bem diferentes delas. Olhando a vida com mais cor, literalmente; com aqueles óculos bafônicos.
Pegamos um  táxi até aquele hotel que mamãe sempre ficava, deixamos as coisas e fomos almoçar. Conversávamos entre uma garfada e outra. Tínhamos bem mais assunto que antes dessa doença.
No caminho de volta, paramos em um sebo para escolher alguns livros. Peguei algumas histórias fantásticas para me entreter enquanto mamãe trabalhava. Algumas delas de Júlio Verne, outras de Meg Cabot; nesse tempo eu me permitia ser menininha e pirata também.
No dia seguinte fomos ao comércio de lá. Tão barulhento quanto o daqui, mas estava contente por conhecer algo novo. Também passamos pelo Bairro da Liberdade. Andei o máximo que pude aguentar; queria ver tudo e mais um pouco. Compramos várias coisas diferentes e roupas inusitadas. Vimos aspectos desta cultura que, até então era desconhecida. Era apaixonante.
Então voltamos ao hotel. Mamãe trabalhava no computador e eu viajava entre as páginas dos livros. No fim da noite, sempre pedíamos pizza.
No último dia, decidimos ir a pontos turísticos. Fomos ao Parque Ibirapuera, à Pinacoteca e ao Jardim Botânico. Era tudo tão bonito, cada espaço contava uma história diferente e eu finalmente conseguia ver além do que estava na minha frente e além do tempo. Imaginei como ficariam os espaços de minha cidade se as pessoas tivessem mais cuidado com eles. Jantamos e voltamos para o hotel às 21:00 para ir embora no voo das 5:00.

No avião, me dei conta de que viajar era maravilhoso e que era isso que eu iria fazer até essa doença me levar. Cheguei em casa e desarrumei as malas. Então desabei na cama.

sábado, 18 de março de 2017

10 coisas para se fazer antes de morrer - A rosquinha nas mãos da Bela Adormecida

Fonte da imagem: google

Eu estava em casa nesta manhã, assistindo A Bela Adormecida; quando a campainha tocou.
-Eu atendo! - Gritou mamãe.
-Querida é pra você. Aquela moça daquele grupo lá.
-Estou ocupada assistindo A Bela Adormecida. Não posso atender agora. Não volte.
-Isso é jeito de falar com alguém?! Vem já aqui! - Ela bufou quando passei por ela e foi embora.
Percebi algumas rosas, uma caixa de chocolates e um envelope em suas mãos.
-Isso é pra mim? - Disse sorrindo. Ela acenou que sim e me entregou tudo de uma vez.
-E...Eu…
-Olha, se eu quisesse ficar com raiva teria procurado esse grupo novamente. Então, por favor, nunca mais venha aqui, você não tem esse direito. - Nesse momento a moça um pouco mais velha que eu ficou sem fala e eu entrei em casa, fechando a porta atrás de mim.
Mas não sei fazer isso com as pessoas, ainda mais agora. Voltei lá fora e puxei seu braço.
-Você foi uma péssima líder. Mas eu te perdoo.
-Ah, eu…
-Tá tudo bem. Até mais.
Mentira, eu não estava nada bem; mas saí dali com um sorriso no rosto. Fingindo que estava tudo legal.
-Ei, tem também mais um tanto de dinheiro que queremos te passar para ajudar no seu tratamento. - Ela gritou bem no meio da rua. Isso me deu tanta raiva que eu entrei, escrevi o número da minha conta em um papel qualquer e entreguei a ela.
-Que bom que vocês pensaram nisso.
-Vou passar para sua conta logo que chegar em casa.
-Ok.


-Mana, tá afim de sair hoje?
-Tô, mas onde conseguiste dinheiro? Não tem teu tratamento pra pagar?
-Sim. Uns amigos meus decidiram se unir para me mandar uma certa quantia. Mandei metade para a conta da mamãe e fiquei com metade.
-Ah sim. Pensei que esses tratamentos fossem mais caros.
-São. E eu deveria estar fazendo mais coisas. Mas sabemos que essa doença já se espalhou demais para acabar agora.
-Não fala assim…
-É a verdade. Eu já não me importo tanto… - Hoje eu estou cheia de mentiras, um velho costume que tinha para não magoar as pessoas. - Que horas posso ir te pegar?
-Tem certeza que queres sair?
-Tenho. Passo aí depois da chuva, ok?
-Ok.
A chuva demorou bem mais do que eu achei que iria. Então, com a rua ainda molhada, saí com meu carrinho. Liguei para Jade logo antes de entrar na rua dela só pra ver se ela já estava pronta.
-Bora, mana! A gente vai é perder o filme.
-Tô indo, calma. Só falta o sapato.
Ela entrou no carro e partimos para o shopping mais próximo.
-Então, vamos mesmo ver aquele filme da bela adormecida com pessoas de verdade?
-Ah, vamos…
Ficamos meia hora na sala e não aguentamos mais.
-Esse filme tá um porre.
-Vamos ver outro?
-Vamos.
Saímos da sala naquele momento e fomos comprar outros ingressos. Escolhemos um filme nacional sobre umas gordinhas poderosas. Como faltava meia hora, fomos comprar algo para comer dentro do cinema. Na fila, começamos a escolher o que iríamos pedir.
-Ei, eu te conheço! - Alguém atrás de mim disse enquanto me cutucava.
-Oi. De onde? - Dei um sorriso para disfarçar o incômodo das cutucadas.
-Estudávamos na mesma escola.
-Mesmo? Desculpa, não me lembro…
-Sim...eu sou amigo do Lucas.
-Ah, sim. Ele falava com tanta gente…
-Poise, ele nos apresentou…
-Ah, desculpa… minha memória é horrível…
-Mana, o que tu vais querer?
-O número 6 e um milkshake. Pede tudo pra viagem.
-Vocês já estão indo embora? Eu queria companhia para um filme.
-Me passa seu celular. Hoje não dá; mas, talvez, outro dia dê.
Trocamos telefones e fomos cada um para o seu lado.
-Mana, o que foi aquilo?!
-Querida, a morte me cai bem.
Entramos logo na sala do cinema e o filme foi muito engraçado. Voltando para casa, paramos em uma loja nova de rosquinhas e pegamos uma caixa cheia pra cada; também levei uma para minha mãe e um bolo para comermos com meu irmão. Passamos o resto da viagem cantando Katy Perry com as janelas abertas.
-Ei, temos que fazer um churrasco.
-Quando?
-Mês que vem, agora estou sem money.
-Tá ok. Vamos nos programar com as meninas. Podes fazer um grupo no WhatsApp?
-Acabei de fazer.
-Como você faz isso?
-Poderes mágicos.
-Tá né…
Nos despedimos na frente da casa dela e eu segui com o carro.
Ao chegar em casa minha mãe estava na sala, assistindo Os Vingadores. Sentei ao lado dela e lhe mostrei a caixa cheia de rosquinhas.
-Oh, minha filha. Obrigada.
-O filme tá bom?
-É o tipo de filme que eu gosto. E o seu filme?
-Tava um porre. trocamos de filme, esse foi bem melhor. Por isso que demorei.
-Você deixou sua farmacinha aqui. Tenha mais cuidado com isso. - Ela me deu um beijo na testa.
-Terei. Pode deixar.


1001 noites de pesadelo - Nunca mais


Sentiu o telefone vibrar várias vezes no seu travesseiro. Abriu os olhos e o colocou na frente do rosto; aquela luminosidade toda a deixou com tanta raiva que o jogou do outro lado do quarto. A porcaria bateu na parede e caiu bem na cama de Romeu. Ela saiu correndo e o pegou de volta; saiu do quarto e decidiu ver o que era aquilo.
-O que?! 72 chamadas não atendidas da mamãe?! - Bufou de raiva. Parece que apesar de tudo o que estava passando ainda tinha que inventar desculpas esfarrapadas para sua progenitora.
-Oi, mãe. Eu tô bem e a senhora?
-Olha aqui garota! Você não tem vergonha de me deixar sozinha aqui! Eu tenho esse problema no joelho, não posso ficar trabalhando assim!
-Tá, eu entendo.
-Volta logo!
-Tá. Até mais.
-Até.
“O que foi isso?! Ela não é assim…”
-Não era sua mãe. - Romeu surgiu na porta com uma ponta de preocupação estampada no rosto.
-O que você quer dizer? - O susto não deixava a moça pensar direito.
-Eram as trevas. É normal estar confusa assim. Imagine quando a minha tentou me amarrar no meio da noite…
-Sim, eu pude ver o que aconteceu daquela vez que você me passou seus pensamentos no carro. Por pouco você não escapa.
-Eu não conseguia ler os pensamentos dela. Então, naquela noite, sonhei com alguém me matando. Acordei assustado e me escondi debaixo da cama. - Seus olhos se encheram de lágrimas.
-Ela entrou no quarto com cordas e te procurou, mas não achou e foi ver no resto da casa.
-Eu conseguia escutar tudo que ela pensava. - Nesse momento o garoto deixou as lágrimas que já estavam em seus olhos rolarem. A moça o abraçou e os dois choraram juntos; lembrando daquela noite horrível e se perguntando o que seria deles nessa corrida contra o tempo.
-Vamos almoçar. - Aquele dia começou cansativo, mas ela estava convencida de que deixaria uma cor naquela data.
-Vamos…
-O que foi? - Ela o abraçou e pode ver o que se passava na mente de Romeu. Ele estava lembrando dos momentos bons com a mãe; parecia ter passado uma década desde que aquilo aconteceu. Ela o apertou mais forte em seus braços. -Você é só uma criança, não deveria ter tanto peso sobre os ombros…
-Eu não entendo tudo isso...
-Vamos almoçar no restaurante aqui perto e depois vamos ao parque. O que acha? - Ela tentou desviar do assunto.
-Tudo bem. - Ele enxugou uma lágrima e sorriu. -Eu pago dessa vez.
-Como assim?
-Você vai ver.
Eles tomaram banho e se arrumaram para sair. Foram ao restaurante ao lado  do hotel que estavam hospedados. Romeu se aproximou perigosamente de um senhor respeitável que estava na porta e ela sentiu uma pontada de medo.
-Senhor, estamos com fome. Poderia comprar algo para comermos?
-Claro, garotinho.
Andaram até o meio da rua, quando Romeu pegou na mão dela. “Esse homem não precisa desse dinheiro. Ele iria gastar com drogas e bebidas. Acho que salvamos a esposa dele de ser violada novamente hoje.” A moça olhou assustada para o garoto. Não tinha coragem de olhar para o homem atrás deles. “A maldade desse mundo é muito grande.”
-Concordo. - Romeu correu até a porta da loja como uma criança que acabou de se lembrar que lá dentro tem sorvete.
-Não me deixa sozinha aqui! - Ela se arrependeu de dizer aquilo tão alto logo que uma mãe de duas crianças a olhou de forma estranha.
-Desculpa. Quero logo fazer meu pedido. Estou com fome.
-Ok, ok.
Eles pediram um bom almoço e o homem logo pagou. Romeu pegou na mão dela e respirou fundo. “Agora passe em uma floricultura para comprar flores e chocolate para sua esposa. Nunca mais a desrespeite. E peça desculpas por ser uma pessoa ruim.”
Ela olhou de Romeu para o homem na sua frente.
Depois de um tempo almoçando ela olhou nos olhos de Romeu. “Nunca faça comigo o que fez com aquele cara”.
-Não dá. Se eu pudesse, já teria feito. Você é muito impulsiva e isso seria facilmente controlado. Mas não consigo controlar sua mente.
-Hum, melhor mesmo.
-Mas seus poderes estão bem melhores.
-Meus poderes?
-Sim. Já conseguimos nos comunicar a distância só com a mente.
-Então eu sou diferente?
-Não, todos têm esse poder. Só alguns desenvolvem até esse ponto.
-Entendo…
-Ainda quero ir ao parque.

-Ok, Ok. - Ela riu.

sábado, 11 de março de 2017

O filho do touro - 1

O sonho começou com esse homem estranho em minha cabeça. Estávamos dançando ao som de Chopin; ballet, claro. Então outra bailarina estava no palco e seu rosto era coberto por um véu cinza, tendo sua roupa da mesma cor. Ela o puxava e ele dançava com essa nova pessoa até se fundirem. Calma, a loucura não acaba aí. Eles viravam um touro e ele começava a me perseguir pelo palco. Eu senti algo em minha cintura e virei para ver; então, novamente, ele estava lá. Com um olhar triste, como se me pedisse perdão, ele me abraçou e eu retornei o abraço. Dançamos até meu despertador tocar e eu ter que acordar desse sonho tão estranho.
Eu queria poder entendê-lo. Toda essa raiva e frustração dentro dele se originaram quando ele era criança; seus pais morreram salvando a cidade que tanto amavam de uma pessoa cruel e maligna. Ao contrário dos pais do garoto, a pessoa continuou aterrorizando a cidade depois daquele fatídico dia. Coube ao menino detê-lo; porém, ele não fez isso por seu lar ou pelas pessoas que lá estavam, mas por vingança. Desde este dia, no qual ele matou o homem que causou a morte de seus pais e a família inteira dele, o menino se isolou por raiva da sociedade; que, agora, o julgava por ter cometido tal crime. O rapaz se isolou do mundo e decidiu que não mais viveria para ajudar os humanos, mas para se vingar deles.
Com o tempo, sua raiva só aumentou. Ele achava que não merecia envelhecer e morrer como os humanos; pois, como seus antepassados, ele poderia mudar sua forma para qualquer criatura viva e tornar-se até mais jovem - porém, isso não lhe permitia escapar do fim de sua jornada entre os vivos. Sua raiva era tanta que o rapaz somente convivia com animais silvestres, chegando a ter vários em sua casa; entre os quais eu me infiltrei.

Por anos eu o vi matar pessoas que se perdiam na floresta e acabavam por encontrar sua morada. Observei tudo calado e atento, procurando uma maneira de ajudar essa alma atormentada; afinal, sou seu parente e minha família me deu essa tarefa. Contudo, não sei o que fazer.

Página do Facebook

Eae, pessoal?! Tudo bem? espero que sim! 
Estou aqui para informá-los que temos uma novíssima página no Facebook : Singularidades Normais. Teremos conteúdo por lá também; além disso, as postagens serão anunciadas pela página. 
Espero que vocês gostem das histórias e bom divertimento.

Natasha - Cap 7

O frio daquela manhã incomum era notável. “Estamos em Belém do Pará! Como podemos ter uma temperatura tão baixa?!”. Natasha acordou e começou a chorar, como fez durante a noite toda a cada meia hora.
-Pequena, você não pode estar com fome! Eu acabei de te dar papinha! - Érica já sentia o cansaço bater e os olhos pesarem. “Eu quero um banho quente…”
Ela carregou a bebê até a cozinha. Botou alguns sachês de chá de camomila e água em uma panela; deixou esquentando e foi pegar toalhas, uma bacia e alguns baldes. Natasha não parou de chorar e isso começava a irritar a moça. Érica tentou dar papinha e alguns brinquedos, mas nada funcionava. Pesquisou motivos de choros e percebeu que faltava algo importante todas as vezes que deu papinha: colocar Natasha para arrotar. Na hora, colocou o bebê na vertical e a pôs para arrotar; o que aconteceu diversas vezes até que ela gofou um pouco e se acalmou.
-Você podia ter dito logo, viu?! - A pequena a olhou de forma cansada e pesarosa. -Desculpe… - A moça a abraçou, como um pedido de desculpas.
A água começou a borbulhar na panela. Érica segurou um dos baldes pela alça e o trouxe até a cozinha, colocou a água quente aos poucos e com muito cuidado (para não queimar Natasha) e o levou de volta ao banheiro; encheu outro balde com água fria e as misturou. Colocou um pouco da água na bacia e mediu a temperatura na sua pele, estava boa; deixou o bebê nesta e a pôs sobre o vaso sanitário. A pequena já estava bem mais esperta e ficou brincando na água enquanto tomava banho. Ao terminar, sua guardiã botou a bacia no chão e se dirigiu ao box para tomar banho; sempre de olho na criança, Érica conseguiu tomar um rápido banho; logo enrolou o bebê em uma toalha pequena e vestiu um roupão para sair do banheiro. Jogou a água da bacia fora e guardou-a junto dos baldes; coisas simples de fazer ficavam bem mais complicadas com um bebê brincalhão no colo.
Ao chegar no quarto, Natasha estava quase dormindo e, depois de seca e vestida, caiu no sono. A moça se enxugou e pôs um vestido. Foi quando se lembrou da bagunça que deixara na cozinha; correu para arrumar tudo e voltou para o quarto.
O berço improvisado da bebê era uma antiga caixa organizadora coberta com diversos tipos de panos que a deixavam bastante confortável.
Enquanto Natasha dormia, Érica participou de uma rápida reunião via Skype com investidores norte americanos e outra com um cliente do guamá. Parecia que a noite mal dormida, fez a criança ficar cansada a ponto de apagar por mais de uma hora. Então ela voltou a chorar e berrar como se não houvesse amanhã.
-Meu Deus! O que tá acontecendo?! - Ela pegou a bebê no colo. -O que você tem?
Natasha ficou vermelha de tanto chorar, como na noite passada. A moça lembrou dos motivos pelos quais os bebês choram e se perguntou se poderia ser algum tipo de cólica. Pegou algum dinheiro, colocou um soutien - nada era fácil com a pequena gritando. Checou o celular pra ver se não tinha nenhuma mensagem e saiu com a criança para a farmácia.
No balcão pediu o medicamento que tinham recomendado no site e voltou para casa.
Percebeu que estava trancada do lado de fora. “Não, isso não pode estar acontecendo!”.
Tocou a campainha diversas vezes até a mãe atendê-la.
-Oi…- Disse com uma cara um tanto cínica.
-Olha, não tenho nada pra te dar… - A mãe brincou.
-Muito engraçado… - Érica continuava na porta.
-Entra, bobinha. O que você foi fazer lá fora?
-Natasha está com cólica e eu fui comprar um remédio.
-Funchicória? Eu tenho…
-Tá brincando?! Meu Deus… - A moça se jogou no sofá, sentindo o cansaço pela correria.
-Mas tá vencido. - A mãe riu do estado da filha, lembrando do passado.
-Ok. Hora da massagem.
-Deixe que eu faço isso. Só olhe. Você já comeu alguma coisa hoje?
-Não que eu me lembre.
-Então prepare algo e volte aqui. Não vai querer cair de fome no meio da rua.
-Então foi por isso que a senhora caiu daquela vez? Nossa…
-Foi. Como você lembra disso? Era tão novinha…
-Foi depois que papai morreu…
-Sim. Fiquei meio perdida; afinal, dividimos sua criação...sem meu companheiro foi difícil. Mas eu sobrevivi e você também vai.
Érica preparou uma salada de frutas e tapioca; foi para a sala ver o que estava acontecendo. Sua mãe estava massageando a barriga de Natasha com todo o carinho e paciência do mundo; como um milagre, parecia que realmente estava funcionando.
-Nem vamos precisar da funchicória. - Ela riu. - Você é um bebê esperto, você é sim.
-Obrigada por me ajudar.
-Não há de quê.
Érica pegou Natasha no colo e saiu andando.
-Você sabe que eu não concordo com o que você está fazendo…
-Mãe…
-Mas vou sempre estar aqui para te ajudar. Conte comigo.

-Obrigada. -Érica estava surpresa com a atitude de sua mãe. Subiu novamente para seu quarto para terminar seu trabalho e colocar Natasha para dormir.

sábado, 4 de março de 2017

Natasha - Cap 6

-Mana, eu já tava esperando por isso. Essa greve já era pra ter rolado a algum tempo. - Érica suspirou de raiva. -Mas tudo bem. Te encontro no shopping. - Então a campainha tocou. “Não estou esperando ninguém...deve ser um  vizinho chato querendo algo da mamãe”.
-Olha, a minha mãe não está…
Ao abrir a porta, ela se deparou com aquela caixa com plástico bolha e um bebê dentro. Sua primeira ação foi olhar ao redor pra ver se a pessoa que deixou a criança ali ainda estava por perto, mas o movimento da rua era intenso naquela hora e já não permitia isso. Então, Érica pegou a caixa e a levou pra dentro.
No instante em que a colocou sobre a mesa da cozinha, o bebê fez questão de acordar e sorrir. “Ah, tá. Isso parece muito com Tarzan.”
-Mas eu não vou cair nos seus encantos. - Ela disse apontando para aquele pequeno nariz, quando uma mãozinha o segurou firmemente. -Você é forte mocinha. Mas não vai querer enfrentar o mundo só com uma fralda, certo? Vamos ver umas roupas para você...
“Meu Deus, estou falando com um bebê”. Ela cerrou os olhos.
-Mas aposto que você me entende. - E a criança sorriu novamente. -Você é uma fofa. Vem, acho que tenho a roupa certa para esta ocasião, madame.
Érica a pegou nos braços, percebendo que havia duas fraldas extras na caixa. “A pessoa te deixa na porta de um desconhecido, mas se importa com você. Ótimo…”
Ela colocou um lençol no chão e o bebê sobre ele, de modo que não fosse possível da criança se machucar. Abriu o guarda roupas e tirou algumas peças e paninhos que fossem bem macios para ver se davam naquela coisinha fofa que não parava de se mexer e brincar.
-O que você acha de um nome? - A criança parou subitamente e olhou pra Érica. Seu celular tocou; era Sophia, já impaciente pela espera. “Mana, mal sabes o que aconteceu comigo.” Quando desligou, ela pôde ver a última música que escutou naquele dia - Natasha.
-Natasha? - E o bebê olhou atentamente, como se aquele já fosse seu nome em vidas passadas. -Tá né…
A moça vestiu o bebê, Natasha, com uma blusa (vestido, agora) e começou a arrumar uma bolsa com as fraldas, uns lenços umedecidos, um lençol pequeno, outro vestidinho, uma pomada hidratante que tinha jogada por lá, talco, sua carteira e celular. Então ela enrolou o bebê em um pano e correu pra rua, chamando um táxi.
-Moço, Shopping Boulevard. Rápido, por favor. - Nessa hora, o bebê começou a chorar. -O que foi? Eu não entendo linguagem de bebê.
-Talvez ela esteja com fome…
-Verdade! Nem tinha pensado nisso…
-Quer que eu pare perto em uma farmácia?
-Você seria muito gentil fazendo isso.
-Então vamos lá.
O taxista aguardou enquanto Érica comprava papinhas prontas, mamadeiras e algumas colheres. Também pegou um pacote de fraldas, lenços próprios para bebês e leite. Já tinha estourado metade do seu salário só com isso. “Caramba, é por isso que as mães fazem baby chá…”
-Obrigada por esperar.
-Não há de quê. Sempre ajudo as mães de primeira viagem. Minha mãe me teve quando era bem mais nova que você.
-Ah, não...não sou mãe dela. Deixaram esse bebê em minha porta.
-Nossa. - Nesse momento eles quase sofrem um acidente. -Desculpa.
-Tudo bem. Já estamos quase chegando, certo?
-Sim senhora.
Durante o trajeto, a moça deu a papinha ao bebê, que comeu feliz da vida.
-Tá vendo?!
Ao chegarem no shopping, o taxista disse a ela que não era preciso pagar a viagem, que seria uma cortesia. Érica agradeceu e desceu cheia de sacolas e Natasha nos braços. Mesmo com tudo isso, ela deu um jeito de pegar o celular e ligar para Sophia.
-Mana, não dá tempo de explicar. Só me encontra no coisinha de carrinhos de bebê.
-Eita. Tô indo.
Érica perguntou a um dos guardas onde poderia alugar um carrinho de bebê e,ao ouvir a resposta, saiu correndo até o local. Ao chegar lá, Sophia já esperava com uma cara raivosa; mas, quando viu a amiga com várias sacolas e o bebê nos braços, correu e pegou um carrinho para colocarem as coisas.
-Mana, o que você vai fazer agora?
-Procurar um advogado.
-Entendo…
-Minha filha, o que é isso? - Érica ficou gelada ao ouvir a voz de sua mãe logo atrás de si.
-M...mãe, deixaram essa criança na porta da nossa casa.
-E o que são todas essas coisas?
-Eu não podia deixar ela com fome e suja.
-Mas não teria que levar ela para algum tribunal?
-Na verdade...eu quero adotá-la…
-Minha filha… - D. Amélia engoliu aquilo em seco. -Vou ligar pra uma amiga minha.
- Mana, tu tens certeza?
-Sim. Não pretendo deixar essa criança correr o risco de ser deixada novamente.
Dali a poucos minutos D. Amélia vinha com uma expressão mais pacífica do que quando saiu.
-Filha, vamos ao advogado. Acabe seu almoço.
-Tá tudo bem, mãe?
-Sim, vai ficar tudo bem.

-Então você supõe que façamos algo ilegal? - Érica não entendia mais nada.
-Sim. É moralmente aceitável. Nenhum juiz lhe dará a guarda dessa criança no estado de vocês agora. - A advogada movia o olhar de Érica para a mãe. - Vocês precisam de tempo para se organizar e pôr tudo em ordem, principalmente com a papelada. Iremos alegar que estávamos procurando pela família biológica e que tivemos atrasos. Depois de 6 meses, iremos entrar com o processo de adoção.
-Muito obrigada, Salete.
-Eu que agradeço por terem me procurado. Agora se concentrem em ter esse aval para a adoção. - A advogada deu um forte abraço em D. Amélia e em Érica. -Boa sorte, pequena. - Ela disse, olhando para Natasha.

-Que notícia boa! - Sophia gritava do outro lado da linha.
-Sim, eu sei. Agora tenho que trabalhar muito para deixar tudo em ordem e as coi…
-Quando vai ser o chá de bebê?
-Que? Eu não vou ter tempo de preparar isso agora…
-Deixe que eu organizo! Nossa, eu sempre quis organizar esse tipo de festa! Só me passe a lista de convidados que eu dou um jeito no resto.
-E...eu não tenho dinheiro…
-Não se preocupe com nada. Agora descanse, seu dia foi agitado.
-Ok, boa noite. Obrigada pela ajuda. - Desligaram logo em seguida. Enquanto Érica se preocupava como iria ter mais tempo e dinheiro para cuidar de Natasha; essa se enrolava em sua cama com os lençóis. Passou a noite acordada, assistindo vídeos de como fazer as coisa da bebê um jeito mais rápido, barato e prático; conseguiu ter algumas ideias de presentes que poderia pedir no baby chá.
Do outro lado da cidade, Sophia bolava a festa. Pensava nos mínimos detalhes para que tudo fosse muito bom.
As duas terminaram tão tarde que já estava amanhecendo.

A casa - redigido em 15/06/2018

Ela acordou ao ouvir as tábuas sendo tiradas de sua porta e os passos apressados. Depois de tanto tempo presenciando os mais diversos tipos ...