sábado, 25 de março de 2017

10 coisas para se fazer antes de partir - Decolagem

Comecei a pensar em coisas rápidas para fazer, mesmo com minhas habilidades físicas comprometidas e meu pouco tempo. Pensei em fazer cursos ou outra especialização, mas isso me tomaria muito tempo e uma disponibilidade que não tinha. Também me imaginei pulando de paraquedas, dançando, fazendo qualquer atividade física e logo depois tendo uma crise respiratória. Quase desisti quando pensei em procurar algo na internet. Digitei “formas de entretenimento para pessoas com câncer”, não tive muito sucesso; era até deprimente de ler. Então eu simplesmente deixei pra lá e fui para o quarto da minha mãe; me joguei na cama ao lado dela.
-Eu vou viajar semana que vem.
-Posso ir? - Perguntei já esperando uma resposta negativa; afinal, uma pessoa no meu estado não poderia sair assim…
-Pode. Estava pensando onde podemos ficar hospedadas.
-Quê?! - Disse bastante animada com a surpresa.
-Vamos! A viagem é semana que vem.
-Temos que ir no comércio comprar algumas coisas. Não tenho malas.
-Nem roupas que te protejam do frio de São Paulo.
-São Paulo?
-Sim. - Ela respirou fundo. - Que horas são?
-Meio dia.
-Acho que dá tempo de ir ao comércio.
Nos arrumamos e pegamos o carro para ir. Andamos por várias lojas de acessórios e malas de viagem, sempre olhando com atenção e comprando o que seria necessário levar. O dinheiro estava curto e minha doença não é motivo para deixar mamãe com dívidas exorbitantes. Quanto mais andávamos, mais eu ficava cansada. Duas horas depois eu já estava exausta demais para continuar andando naquele local quente.
-Mãe, estou muito cansada. Podemos ir embora?
-Claro minha filha. Amanhã voltamos, ok? Ainda preciso comprar algumas coisas.
E voltamos no dia seguinte, passando sempre pouco tempo. Eu me sentia cada vez mais cansada por causa da quimio. Meus cabelos estavam caindo, mas eu aceitei isso com uma rapidez tão grande que já não ligava que no dia da viagem eu estaria careca.
Entramos no aeroporto com nossas malas escandalosas compradas no comércio e todos nos olhavam; estávamos bastante diferentes, um dos nossos truques para identificarmos as malas de longe. Fizemos todos os rituais preparativos para o voo - nos quais eu fui parada e tive que jogar um desodorante fora; então, decolamos. Eu dormi a viagem inteira.
Chegamos naquela cidade fria, mas eu estava com moletom colorido por causa do avião. Todos olhavam para nós novamente. Eram várias pessoas iguais, com malas e roupas iguais. Estávamos bem diferentes delas. Olhando a vida com mais cor, literalmente; com aqueles óculos bafônicos.
Pegamos um  táxi até aquele hotel que mamãe sempre ficava, deixamos as coisas e fomos almoçar. Conversávamos entre uma garfada e outra. Tínhamos bem mais assunto que antes dessa doença.
No caminho de volta, paramos em um sebo para escolher alguns livros. Peguei algumas histórias fantásticas para me entreter enquanto mamãe trabalhava. Algumas delas de Júlio Verne, outras de Meg Cabot; nesse tempo eu me permitia ser menininha e pirata também.
No dia seguinte fomos ao comércio de lá. Tão barulhento quanto o daqui, mas estava contente por conhecer algo novo. Também passamos pelo Bairro da Liberdade. Andei o máximo que pude aguentar; queria ver tudo e mais um pouco. Compramos várias coisas diferentes e roupas inusitadas. Vimos aspectos desta cultura que, até então era desconhecida. Era apaixonante.
Então voltamos ao hotel. Mamãe trabalhava no computador e eu viajava entre as páginas dos livros. No fim da noite, sempre pedíamos pizza.
No último dia, decidimos ir a pontos turísticos. Fomos ao Parque Ibirapuera, à Pinacoteca e ao Jardim Botânico. Era tudo tão bonito, cada espaço contava uma história diferente e eu finalmente conseguia ver além do que estava na minha frente e além do tempo. Imaginei como ficariam os espaços de minha cidade se as pessoas tivessem mais cuidado com eles. Jantamos e voltamos para o hotel às 21:00 para ir embora no voo das 5:00.

No avião, me dei conta de que viajar era maravilhoso e que era isso que eu iria fazer até essa doença me levar. Cheguei em casa e desarrumei as malas. Então desabei na cama.

Um comentário:

  1. ESTA DOENÇA É MUITO TRISTE , PORÉM SE FAMILIARES E AMIGOS APOIAREM O PACIENTE, ELA SE TORNA MAIS LEVE PQ A PESSOA SE SENTE AMADA.

    ResponderExcluir

A casa - redigido em 15/06/2018

Ela acordou ao ouvir as tábuas sendo tiradas de sua porta e os passos apressados. Depois de tanto tempo presenciando os mais diversos tipos ...