Durante várias noites tive
pesadelos. Era basicamente a mesma coisa: uma moça jogada no chão e, quando eu
me abaixava para ver quem era, ela me segurava pelos ombros e sussurrada algo;
depois eu acordava gritando e ela estava ao lado da minha cama com uma roupa
preta ensanguentada; então eu piscava e ela sumia. Era horrível.
Em pouco tempo me senti
desprotegida. Não conseguia mais dormir ou ir aos lugares sozinha. RI Ta sempre
estava preocupada comigo; percebeu meu estado de ansiedade e nervosismo. Ela
procurava sempre estar junto a mim.
Certo dia ela não pode ir
comigo até o metrô, então ligou para Erick. Este me esperaria na estação.
-Vá logo. Ele está te
esperando. - Ela sorriu para mim.
-Tudo bem. - Eu disse,
retribuindo o sorriso. Fui andando rapidamente até a estação e, lá, encontrei
Erick com algumas sacolas.
-Oi, tudo bem?
-Tudo sim. E contigo? - Eu ri
- E essas sacolas?
-Ah, são algumas coisas que eu
comprei. -Ele se sentou em um banco próximo. -Está com fome? Eu trouxe tortas.
-Tem de morango? - Já era
tarde e fazia algum tempo desde minha última refeição
-Tem sim. - Ele tirou uma
pequena sacola do meio das outras. Me senti meio envergonhada quando Erick me
entregou a torta, que direito eu teria de comer aquilo?! -Coma, vai se sentir
melhor.
-Ah, obrigada. - Me sentei ao
lado dele e, ao pegar o garfo, senti aquele vento frio novamente.
Do outro lado dos trilhos,
havia aquele espelho enorme e, como antes, via aquela sombra encostando em meu
ombro. Ao olhar um pouco além de meu reflexo, percebi que Erick também via
aquilo, boquiaberto, congelado, morrendo de medo. Tive a impressão de que o
rapaz temia a sombra bem mais que eu.
Estávamos novamente na estação
de trem; antiga e empoeirada, ela se levantava ao nosso redor. Nos trilhos,
algo se movia; uma massa disforme fazia barulhos de ossos batendo no chão e se
aproximando da beirada, logicamente, de mim e Erick. Não conseguia me mover,
mesmo que o rapaz puxasse e empurrasse meu corpo gritando meu nome.
-Vamos! Vamos! - Ele me dizia.
-Vem logo! -Erick me segurou pelo braço e saímos correndo. Corremos até os pés
cansarem e as pernas do eram, mas a estação parecia sem fim; e o barulho dos
ossos no chão continuava a poucos metros.
Sem aguentar mais, caí. Me
Machuqueiras sem poder mais andar.
-Erick, me ajuda! - Mas senti
as mãos meladas da massa disforme que nos perseguia agarrar meu calcanhar e ví
os medos nos olhos do rapaz. Ele saiu correndo, me deixando sozinha com aquela
criatura.
Virei para olhar o que
agarrava meu pé e...era uma moça toda de branco, bem maquiada e muito bonita.
Ela chegou cada vez mais perto e, por fim, me abraçou. Eu pisquei por um
segundo e, ao abrir os olhos, me encontrei naquele banheiro imundo em que
acordei; pude ver alguém carregando meu corpo para dentro do box. Levei um
choque ao perceber que essa pessoa era Erick. Dali a pouco, entraram mais
alguns rapazes, eu conhecia todos. Que raiva! O ódio que subiu em mim me fez
soltar um grito estridente. Pisquei novamente e voltei para a estação de trem e
a moça doce que me abraçava se transformou: sua pele era cinzenta, seus olhos
tinham o vermelho do sangue; este também estava nas vestes negras e sujas em
seu corpo, com ossos quebrados.
Ela sorriu de forma
maquiavélica para mim, como quando se seduz alguém, e olho para frente.
-Meu Deus! -Erick gritava,
totalmente histérico. A moça avançou nele e se jogou nos trilhos do trem. Um
metrô passou por cima deles e eu percebi que tinha voltado à estação normal. Um
alvoroço se formou perto dos trilhos e ao redor de mim. RI Ta estava lá; ela me
levantou e me levou até um táxi. Lhe contei tudo o que ví.
-Não; isso ninguém mais viu.
-Ela me olhava como se eu fosse desmaiar. -Vocês ficaram conversando por um
tempo; depois ele te agarrou e ia te jogar nos trilhos do trem junto com ele.
Sorte que você caiu e ele foi sozinho. -Ela respirou fundo. -A moça que você
viu foi a tec-tec.
-Quem?! -Ri Ta me contou a
história dela.
...
Poucos dias depois do que
ocorreu na estação de metrô, recebi notícias do meu país de origem. Todas
relatavam suicídios estranhos das pessoas que ví naquele dia, dentro do
banheiro.
Dentro do meu quarto, ao me
arrumar antes do trabalho, estava escovando o cabelo na frente do espelho e
pude ver a sombra da tec-tec. Ela estava de branco; veio até mim e tocou meus
cabelos. Sorri de volta. Ela virou fumaça branca e saiu pela janela, por onde
entrava a luz do sol.
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